Enquanto as almas desprendidas das influências terrenas
se constituem em grupos simpáticos, cujos membros se amam, se compreendem,
vivem em perfeita igualdade, em completa felicidade, os Espíritos que ainda não
puderam domar as suas paixões levam uma vida errante, desordenada e que, sem lhes
trazer sofrimentos, deixa-os, contudo, mergulhados na incerteza e na inquietação.
É a isso que se chama erraticidade; é a condição da maioria dos Espíritos que
viveram na Terra, nem bons nem maus, porém ainda fracos e muito inclinados às
coisas materiais.
Encontram-se na erraticidade multidões imensas, sempre
agitadas, sempre em busca de um estado melhor, que lhes foge. Numerosos
Espíritos aí flutuam indecisos entre o justo e o injusto, entre a verdade e o
erro, entre a sombra e a luz. Outros estão sepultados no insulamento, na
obscuridade, na tristeza, sempre à procura de uma benevolência, de uma simpatia
que podem encontrar.
A ignorância, o egoísmo, os vícios de toda espécie
reinam ainda na erraticidade, onde a matéria exerce sempre sua influência. O bem
e o mal aí se chocam. É de alguma sorte o vestíbulo dos espaços luminosos, dos
mundos melhores. Todos aí passam e se demoram, mas para depois se elevarem.
O ensino dos Espíritos sobre a vida de além-túmulo
faz-nos saber que no espaço não há lugar algum destinado à contemplação
estéril, à beatitude ociosa. Todas as regiões do espaço estão povoadas por
Espíritos laboriosos. Por toda parte, bandos, enxames de almas sobem, descem,
agitam-se no meio da luz ou na região das trevas. Em certos pontos, vê-se grande
número de ouvintes recebendo instruções de Espíritos adiantados; em outros,
formam-se grupos para festejarem os recém-vindos. Aqui, Espíritos combinam os fluidos,
infundem-lhes mil formas, mil coloridos maravilhosos, preparam-nos para os
delicados fins a que foram destinados pelos Espíritos superiores; ali,
ajuntamentos sombrios, perturbados, reúnem-se ao redor dos globos e os
acompanham em suas revoluções, influindo, assim, inconscientemente, sobre os
elementos atmosféricos. Espíritos luminosos, mais velozes que o relâmpago,
rompem essas massas para levarem socorro e consolação aos desgraçados que os
imploram. Cada um tem o seu papel e concorre para a grande obra, na medida de
seu mérito e de seu adiantamento. O Universo inteiro evolui. Como os mundos, os
Espíritos prosseguem seu curso eterno, arrastados para um estado superior, entregues
a ocupações diversas. Progressos a realizar, ciência a adquirir, dor a sufocar,
remorsos a acalmar, amor, expiação, devotamento, sacrifício, todas essas
forças, todas essas coisas os estimulam, os aguilhoam, os precipitam na obra;
e, nessa imensidade sem limites, reinam incessantemente o movimento e a vida. A
imobilidade e a inação é o retrocesso, é a morte. Sob o impulso da grande lei,
seres e mundos, almas e sóis, tudo gravita e move-se na órbita gigantesca
traçada pela vontade divina.
Léon Denis - Depois da Morte