“A vida espiritual, de maravilhosa beleza, não faz esquecer
os nossos amigos terrenos. Por felizes que sejamos, por indizíveis que sejam os
gozos que nos embriagam, sempre e sem cessar somos atraídos para o lugar onde
transcorreu a nossa última existência, para todos aqueles a quem nos unem os
laços de uma afeição fraterna, para junto de vós, enfim, ó bem-amados.
“Sim, pensamos em vós, mesmo das alturas mais inacessíveis
a que se possa elevar o pensamento! Vimos até onde estais para vos repetir, num
eco distante, que deveis esperar e amar acima de tudo, por muito rude, por
muito árida que seja a vida. A esperança e o amor vertem, na existência, a
linfa do esquecimento. Dão a coragem, a vontade forte que nos permitem arrostar
de ânimo sereno a tempestade. Mas, venha a calma após a borrasca, venha a hora
do repouso benéfico e sentireis que nas vossas veias circula a eterna
felicidade celeste, que Deus espalha sem medida pelos pobres humanos.
“O tempo, às vezes, vos parece bem longo. De nós esperais
as menores comunicações com impaciência e também com uma espécie de
curiosidade, e cheios de vaga esperança de que elas vos venham revelar alguma
coisa do mistério dos mundos.
“A Providência, porém, sabe que as revelações não seriam
compreendidas. Não! A hora ainda não soou! As frases que vos possamos
transmitir ficarão sendo, por enquanto, meras frases; exortações à prática do
bem, certamente! Cumpre orientar para o melhor as pobres almas sofredoras. Pela
doçura, pela bondade, deveis chamar ao vosso seio os irmãos incrédulos. E
podeis também, pela caridade, fazer-lhes entrever a meta sublime para a qual
deve tender a vida.
“A vida continua, bem o sabeis. Só muda a forma. Todavia,
não muda demasiado rápido, porquanto, durante largo tempo, nos conservamos
terrestres.
Quiséramos poder exprimir-vos tudo o que o infinito nos
dá a contemplar. Mas, ah!, a linguagem humana é pobre, suas palavras são duras,
agudas, pesadas como a matéria, ao passo que seriam precisas palavras leves e
suaves, de uma suavidade toda especial, capazes de exprimirem os sons e as
cores. A atmosfera que vos envolve é por demais espessa para permitir que
percebais, ainda que pouco, toda a harmonia que reina nos planos superiores do
Universo. Ah!, que esplendores aí se desdobram! E que consolação, que grande
recompensa aos nossos males é esta vida, esta embriaguez de todos os instantes!
“Continuamos a ocupar-nos das almas errantes, mas a
fonte de amor em que nos dessedentamos é tão viva e tão abundante, que basta
para nos deixar entrever destinos inda mais gloriosos. A ascensão prossegue,
sem nunca parar. Subir ainda, subir sempre, sem jamais atingi-lo, para o foco
da perfeição, para a Causa suprema que nos deve absorver, conservando-nos a
personalidade própria.
“O amor, qualquer que seja o mundo em que se esteja, é
a força, o eixo das esferas que gravitam em suas órbitas. Na natureza, nos
infinitamente pequenos, é o amor, antes de tudo, que guia o instinto. No homem,
na sociedade inteira, é o amor que forma as simpatias, que torna possíveis as
relações dos humanos entre si. Seja qual for a expressão sob a qual o queiram
deformar, seja qual for o nome com que o ridiculizem, se analisardes um pouco,
encontrareis sempre o amor, o amor mais ou menos purificado, que existe em todo
ser. Ele é o centro, a causa. Reina no lar. É sobre suas fiadas que se constrói
a família, a família que perpetua, no tempo e no espaço, a longa série dos
séculos, marcando o progresso das humanidades. E é também o amor que rege as amizades
sólidas.
“Constituís uma força poderosa, quando as mesmas idéias,
o mesmo ardente desejo do bem vos animam. A força fluídica que vos cerca é
considerável, e se, de sua resistência, o granito vos pode dar idéias, o
cristal, em cujas facetas se vem irisar a luz, poderá fazer-vos perceber-lhe a
incomparável pureza.
“Desde o menor até o maior, amai; e, em vossos corações,
em vossas almas, correrá a fonte de vida. Sim, é necessário amar ainda, amar
sempre, ensinando, continuando a propagar, em toda a sua grandeza, a filosofia
que encerra o porquê dos destinos humanos. Trabalhai a terra; deixai que nela
entre a relha do poderoso arado do amor e, um dia, as messes louras germinarão
ao sol radiante do futuro. Propagai sem descanso. Propagai amando.
Eduardo Petit.”
(Morto a 15 de setembro de 1910,
Praça de Vaugirard, 2 - Paris.)
(Morto a 15 de setembro de 1910,
Praça de Vaugirard, 2 - Paris.)
Léon Denis em
O além e a sobrevivência do Ser
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