quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020
O vale dos suicídas
Camilo Cândido Botelho
Precisamente no mês de janeiro do ano da graça de 1891, fora eu surpreendido com meu aprisionamento em região do Mundo Invisível cujo desolador panorama era composto por vales profundos, a que as sombras presidiam: gargantas sinuosas e cavernas sinistras, no interior das quais uivavam, quais maltas de demônios enfurecidos, Espíritos que foram homens, dementados pela intensidade e estranheza,
verdadeiramente inconcebíveis, dos sofrimentos que os martirizavam.
Nessa paisagem aflitiva da contemplação, com a vista torturada do grilheta, não distinguiria sequer o doce vulto de um arvoredo que testemunhasse suas horas de desesperação, tampouco paisagens
confortativas que pudessem distraí-lo da
contemplação cansativa dessas gargantas
onde não penetrava outra forma de Vida
que não a traduzida pelo supremo horror!
[...]
Não havia então ali, como não haverá
jamais, nem paz, nem consolo, nem esperança: tudo em seu âmbito marcado pela
desgraça era miséria, assombro, desespero
e horror.
[...]
Aqui, era a dor que nada consola, a desgraça que nenhum favor ameniza, a tragédia que ideia alguma tranquilizadora vem
orvalhar de esperança! Não há céu, não
há luz, não há sol, não há perfume, não há
tréguas!
O que há é o choro convulso e inconsolável dos condenados que nunca se
harmonizam! O assombroso “ranger dos
dentes” da advertência prudente e sábia
do sábio Mestre de Nazaré! A blasfêmia
acintosa do réprobo a se acusar a cada
novo rebate da mente flagelada pelas recordações penosas! A loucura inalterável de consciências contundidas pelo vergastar infame dos remorsos! O que há é a
raiva envenenada daquele que já não pode
chorar, porque ficou exausto sob o excesso das lágrimas! O que há é o desaponto, a surpresa aterradora daquele que se
sente vivo a despeito de se haver arrojado
na morte! É a revolta, a praga, o insulto, o
ulular de corações que o percutir monstruoso da expiação transformou em feras!
O que há é a consciência conflagrada, a
alma ofendida pela imprudência das ações
cometidas, a mente revolucionada, as faculdades espirituais envolvidas nas trevas
oriundas de si mesma! [...].
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário